Norma para derrubar aeronaves teve oposição de americanos
Em papéis do Itamaraty obtidos pela Folha, os EUA ameaçaram cortar a inteligência sobre o tráfego na Amazônia
Em papéis do Itamaraty obtidos pela Folha, os EUA ameaçaram cortar a inteligência sobre o tráfego na Amazônia
Por RUBENS VALENTE E FERNANDA ODILLA
A lei que autoriza o abate de aviões considerados suspeitos de transportar drogas no Brasil, aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência, demorou seis anos para ser colocada em prática por pressões do governo dos EUA e em atendimento a pedido da então secretária de Estado, Madeleine Albright.
É o que revelam telegramas e despachos confidenciais do Itamaraty produzidos entre os anos de 1990 e 2001.
Eles fazem parte do novo lote de 221 documentos que serão divulgados a partir de hoje no “Folha Transparência”, projeto que disponibiliza informações de interesse da sociedade na Folha.com.
É o que revelam telegramas e despachos confidenciais do Itamaraty produzidos entre os anos de 1990 e 2001.
Eles fazem parte do novo lote de 221 documentos que serão divulgados a partir de hoje no “Folha Transparência”, projeto que disponibiliza informações de interesse da sociedade na Folha.com.
BASTIDORESAs correspondências inéditas expõem bastidores da “guerra às drogas”, que foi desencadeada pelos EUA na década de 90.
Nessa área, um dos nós na relação Brasil-EUA era a lei que autoriza a Aeronáutica brasileira a destruir aeronaves sob suspeita de estar a serviço do narcotráfico.
Em 1998, a “Lei do Abate”, tratada como “tiro de destruição”, foi aprovada no Congresso e, em seguida, sancionada pelo então presidente, Fernando Henrique Cardoso. Mas ela só foi regulamentada no ano de 2004, durante o governo Lula.
A lei gerou enorme controvérsia dentro e fora do governo FHC. O então secretário nacional antidrogas, Wálter Maierovitch, a chamou de “pena de morte”.
Sabia-se do descontentamento dos EUA, que evitava manifestações públicas. Em 2000, por exemplo, em entrevista à Folha, o então secretário de Defesa, William Cohen, desconversou: “Os EUA não tomam posição”.
Os telegramas confidenciais que foram agora liberados pelo Itamaraty apontam outra realidade.
Os EUA eram no início favoráveis ao abate (haviam apoiado e ajudado a aplicar leis semelhantes no Peru e na Colômbia). Depois, passaram a torpedeá-la, mas não por motivos humanitários.
Nessa área, um dos nós na relação Brasil-EUA era a lei que autoriza a Aeronáutica brasileira a destruir aeronaves sob suspeita de estar a serviço do narcotráfico.
Em 1998, a “Lei do Abate”, tratada como “tiro de destruição”, foi aprovada no Congresso e, em seguida, sancionada pelo então presidente, Fernando Henrique Cardoso. Mas ela só foi regulamentada no ano de 2004, durante o governo Lula.
A lei gerou enorme controvérsia dentro e fora do governo FHC. O então secretário nacional antidrogas, Wálter Maierovitch, a chamou de “pena de morte”.
Sabia-se do descontentamento dos EUA, que evitava manifestações públicas. Em 2000, por exemplo, em entrevista à Folha, o então secretário de Defesa, William Cohen, desconversou: “Os EUA não tomam posição”.
Os telegramas confidenciais que foram agora liberados pelo Itamaraty apontam outra realidade.
Os EUA eram no início favoráveis ao abate (haviam apoiado e ajudado a aplicar leis semelhantes no Peru e na Colômbia). Depois, passaram a torpedeá-la, mas não por motivos humanitários.
AMEAÇAA discórdia residia na exigência dos EUA, que queriam aval do governo brasileiro para declarar que “a soberania” do Brasil estava “ameaçada” pelo narcotráfico -o que os brasileiros, principalmente o meio militar, rechaçaram.
Isso porque consideraram que o aval seria uma porta aberta para a ação norte-americana em território nacional e para a discussão sobre a posse da Amazônia.
As pressões começaram em 97, quando a Embaixada dos EUA pediu ao relator do projeto, senador Romeu Tuma, que o “retardasse”.
A embaixada estava longe de agir por conta própria. Em “non-paper” (extraoficial) entregue ao Itamaraty, os EUA fizeram ameaça direta.
Tal ameaça dizia que, se o Brasil aprovasse a lei, eles cortariam toda informação de inteligência sobre tráfego aéreo na Amazônia.
Coletados por extensa rede de radares e aviões de vigilância, os dados seriam compartilhados com autoridades brasileiras, desde que o presidente dos EUA considerasse a “soberania” do Brasil ameaçada.
O impasse se prolongou até abril de 1999. Naquele mês, uma carta do então chanceler brasileiro, Luiz Felipe Lampreia, dirigida a Albright esclarece que o Brasil decidiu “congelar” a aplicação da lei. A decisão foi tomada após “prévias conversações”, como explica Lampreia.
Meses depois, Maierovitch foi a Washington manifestar-se contra a lei, evocando questões humanitárias, sem saber que havia sido bloqueada por razões menos nobres.
Isso porque consideraram que o aval seria uma porta aberta para a ação norte-americana em território nacional e para a discussão sobre a posse da Amazônia.
As pressões começaram em 97, quando a Embaixada dos EUA pediu ao relator do projeto, senador Romeu Tuma, que o “retardasse”.
A embaixada estava longe de agir por conta própria. Em “non-paper” (extraoficial) entregue ao Itamaraty, os EUA fizeram ameaça direta.
Tal ameaça dizia que, se o Brasil aprovasse a lei, eles cortariam toda informação de inteligência sobre tráfego aéreo na Amazônia.
Coletados por extensa rede de radares e aviões de vigilância, os dados seriam compartilhados com autoridades brasileiras, desde que o presidente dos EUA considerasse a “soberania” do Brasil ameaçada.
O impasse se prolongou até abril de 1999. Naquele mês, uma carta do então chanceler brasileiro, Luiz Felipe Lampreia, dirigida a Albright esclarece que o Brasil decidiu “congelar” a aplicação da lei. A decisão foi tomada após “prévias conversações”, como explica Lampreia.
Meses depois, Maierovitch foi a Washington manifestar-se contra a lei, evocando questões humanitárias, sem saber que havia sido bloqueada por razões menos nobres.
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